terça-feira, 25 de janeiro de 2011

OBSERVAÇÃO DE AVES (DEZEMBRO 2010) (Anexos)

Julgo que quem consultou a lista das aves por mim observadas em Dezembro de 2010, percebeu que este anexo se iria alargar um pouco mais do que os anteriores. Apesar de neste meio (blogosfera) não serem aconselháveis os textos muito desenvolvidos, a inscrição de 5 (cinco!!!) novas espécies na minha lista de registos no estuário do Cávado, incluindo três cuja homologação foi requerida ao Comité Português de Raridades e ainda uma nova Ordem, obrigou-me a estender esta apresentação para lá do que é recomendável. Junto algumas imagens para tentar tornar isto mais agradável.


Confirmação da ocorrência de duas novas espécies de ANSERIFORMES

No estudo sobre a avifauna do estuário do Cávado que aqui apresentei no decorrer do ano de 2009, referia-me assim à espécie Anser anser (Ganso-bravo): «No final de Outubro de 2000 surgiu no estuário do Cávado um par de indivíduos que se manteve na área durante aquele Inverno até ao mês de Fevereiro, entretanto, em Janeiro e depois em Dezembro de 2003, foi avistado outro espécime e, em Fevereiro de 2006, o mesmo habitat foi frequentado por um bando constituído por 6 (seis) aves». Creio que através destas palavras se percebe facilmente a escassez de ocorrências daquela espécie nesta zona húmida e até no território nacional mas que, apesar de tudo, ainda consta no Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal (LVVP).

De facto, há quase cinco anos que não registava a passagem de gansos selvagens nesta região, até que no último mês avistei uma ave que me levou a preencher a Ficha de Registo de Observação do Comité Português de Raridades (CPR), onde escrevi: «Obviamente um Ganso “cinzento” com indícios de branco na base do bico. Menor que o Anser anser e com patas cor-de-laranja. A ave surgiu isolada vinda do mar no dia 10 de Dezembro de 2010 e abrigou-se entre um grande bando de Patos-reais. Ao tentar aproximar-me, logo se pôs em fuga quando me detectou ainda a mais de 100 metros de distância. No dia 16, a partir do interior do meu automóvel, ainda a consegui fotografar a cerca de 50 metros de distância, mas rapidamente se afastou para a margem oposta». Aqui ficam duas dessas (desastrosas) imagens:


 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Referia-me à identificação de um Anser albifrons (Ganso-grande-de-testa-branca), espécie tão pouco esperada entre nós que aquele registo requer, efectivamente, a homologação por parte do CPR. Desde aquele primeiro registo, a ave foi aqui diversas vezes observada até ao dia 24 de Janeiro de 2011, mas sempre a longas distâncias.

O entusiasmo sentido com a presença desta ave encontrava justificação no modo como é apresentada na diversa literatura consultada, entre a qual se destaca o novo livro de referência dos ornitólogos nacionais (Catry P., Costa H., Elias G. & Matias R. 2010. AVES DE PORTUGAL – ORNITOLOGIA DO TERRITÓRIO CONTINENTAL. Assírio & Alvim, Lisboa), onde apenas são indicados meia dúzia de registos conhecidos e está classificada como uma espécie acidental. Por tal, este ganso não consta no LVVP, mas a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) atribuiu-lhe o estatuto de conservação global de «Pouco Preocupante». O Noticiário da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) nº. 372 refere-se ao registo de um indivíduo desta espécie no estuário do Cávado em Dezembro de 2008, no entanto, esta não consta na Lista de Aves Referenciadas para o Parque Natural do Litoral Norte (PNLN). A título de curiosidade também pode ser referido que no Anexo A – I da Directiva Aves a subespécie Anser albifrons flavirostris é prioritária.



Posteriormente voltei a dirigir-me ao CPR deste modo: «Desde 14.12.2010. Três aves extremamente cautelosas que muito dificilmente permitem grandes aproximações, apesar de serem conspícuas. Quase nunca se separam e, quando não descansam, percorrem águas quase rasas, principalmente as margens, em actividade conjunta de caça: formam uma linha e, com o dorso emerso, mergulham a cabeça para capturarem pequenos peixes (fazem-no a velocidades muito rápidas). Foram observadas desde a foz propriamente dita até cerca de três quilómetros desta (junto à ponte da A28 em Fão). Frequentam sobretudo o “Sapal” e o “Lodaçal a Descoberto na Maré” junto ao Forte de São João Baptista em Esposende, mas também podem ser encontrados entre os grandes bandos de Pato-real e Marrequinhos abrigados nos canais do “Juncal”». Embora não tenha sido feita a descrição das aves com detalhe, enviei para aquele comité as seguintes imagens:






 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Embora num primeiro momento tenha confundido estes três espécimes com os três(!) Mergus serrator (Mergansos-de-poupa) que tinham começado a chegar desde 16 de Novembro e que apenas se deixavam observar e fotografar ao longe (próxima imagem),

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

numa análise mais atenta das fotos que entretanto ía obtendo, pude confirmar que estávamos perante a espécie Mergus merganser (Merganso-grande), cuja confirmação também necessita de homologação pelo CPR.

No mencionado livro AVES DE PORTUGAL apenas estão indicadas duas ocorrências desta espécie [um indivíduo em Caminha em 1997 e outro no estuário do Cávado em Janeiro de 2000 (dados também apresentados no Anuário nº. 1 da SPEA)], pelo que está classificada de acidental no nosso território. Do mesmo modo, esta ave não surge mencionada no LVVP e a UICN considera o seu estatuto de conservação a nível global «Pouco Preocupante». Também não consta na Lista de Aves Referenciadas para o PNLN.

Em 24 de Janeiro de 2011 os três indivíduos ainda podiam ser encontrados no estuário do Cávado.



Confirmação da ocorrência de uma nova espécie pertencente a uma nova Ordem: GAVIIFORMES

Até aqui já me referi várias vezes a espécies que não encontramos no LVVP. De seguida irei abordar a família Gaviidae que não consta por inteiro nas tabelas daquele livro de referência.

Conhecidas genericamente por Mobelhas, são três as espécies desta família que poderão ocorrer nas águas territoriais nacionais como Invernantes Raras: - a Gavia stellata (Mobelha-pequena), a Gavia arctica (Mobelha-árctica ou M.-de-garganta-preta) e a Gavia immer (Mobelha-grande). Não abundam os registos de ocorrências próximo da costa de qualquer uma destas aves de proveniência setentrional, no entanto, durante ou após períodos em que as condições climatéricas se apresentam adversas é possível que se refugiem em águas abrigadas durante alguns dias. Terá sido nessas circunstâncias que em Dezembro de 2004 surgiu na foz do Cávado uma Gavia stellata (Noticiário 165) e em Janeiro de 2007 uma Gavia immer (Noticiário 264).

No dia 24 de Dezembro de 2010, quando me encontrava próximo do Centro Marítimo de Esposende, deparei-me com esta ave:



 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

que, mais uma vez, me levou a dirigir-me ao CPR, expondo «Obviamente uma Gavia (julgo que juvenil) com um comprimento total ligeiramente superior ao dobro do Guincho-comum. Manteve-se a alimentar-se durante cerca de duas horas a menos de uma milha da foz, muito próximo da doca de recreio (quando não havia movimento de embarcações). Só foi possível vê-la a capturar solhas. Não foi vista em voo». Também não desenvolvi a descrição da ave, mas julgo que bastariam as imagens enviadas para um diagnóstico seguro. Nos dias seguintes mantive-me vigilante a acompanhar os movimentos da ave junto à foz, levando-me, no dia 30, a actualizar a informação perante o CPR «A Gavia immer foi igualmente avistada hoje durante mais de uma hora a debater-se, mais uma vez, com uma pequena solha, na qual não cessava de desferir bicadas e de a “mastigar”, parecendo ter necessidade de a amolecer antes de a poder engolir. Tem sido assim que constantemente a observo. As quatro imagens que agora lhe envio foram registadas no último dia 26 às primeiras horas do dia. Julgo que a ave acabava de despertar e encontrava-se junto aos molhes da foz do Cávado, onde montei abrigo. Quase imóvel, a mobelha deixou-se deslizar ao sabor da corrente e passou por mim (invisível) a cerca de 5 metros entre pedras».






 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Face a estas imagens, não restaram dúvidas de que estava perante uma Gavia immer (Mobelha-grande), espécie classificada pela UICN com o estatuto de conservação «Pouco Preocupante». Não consta na Lista de Aves Referenciadas para o PNLN. Foi por mim observada pela última vez no dia 1 de Janeiro de 2011.



Confirmação da ocorrência de duas novas espécies de PASSERIFORMES

Mais do que a vasta literatura sobre a avifauna nacional ou europeia, os registos divulgados pelos birdwatchers desta região, a par da “Lista de Aves referenciadas para o Parque Natural Litoral Norte”, apresentada na caracterização biológica do respectivo plano de ordenamento, revelam-se como instrumentos muito úteis para quem se propõe a estudar as aves no estuário do Cávado, na medida em que, de certa forma, estes testemunhos também nos orientam na procura das espécies que aqui podemos encontrar.

Assim, quando é oportuno, dirijo especial atenção às espécies mencionadas no referido documento do Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB) que ainda não estão inscritas na minha lista pessoal (actualização anual a publicar aqui ainda este mês). Entre estas, estão algumas aves da Família Alaudidae, constituída por quatro espécies de Calhandras (uma já extinta no território nacional) e outras quatro de Cotovias. Enquanto as primeiras se distribuem sobretudo pelo sul e interior do País, entre as restantes quatro, três estão indicadas pelo ICNB como presentes nesta área protegida: a Alauda arvensis (Laverca), particularmente abundante durante a aproximação ao Inverno; a Lullula arborea (Cotovia-dos-bosques também conhecida por Cotovia-pequena), cuja ocorrência apenas confirmo para nascente da Arriba Fóssil deste concelho; e a Galerida cristata (Cotovia-de-poupa), possivelmente já observada por mim próprio nos campos de cultivo da região, mas ainda não confirmada devido às semelhanças desta com a espécie dominante (Laverca). Mais uma vez, impunha-se o registo fotográfico como meio de concretizar esta identificação sem hesitações.





 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

Obtidas no dia 13 de Dezembro de 2010 nos terrenos da margem direita do estuário, estas imagens acabaram por demonstrar inequivocamente que a Galerida cristata (Cotovia-de-poupa) ocorre no litoral norte. De referir que durante todo o final de Outono passaram naqueles habitats semi-naturais muitas centenas de Lavercas em bandos muito compactos, o que, por si só, transformou a localização desta nova espécie numa “procura de agulhas em palheiros”. Assim, permanece por conhecer a abundância com que estas aves surgem entre nós. Para o território continental é considerada «Residente pouco comum a comum» e o seu estatuto de conservação é «Pouco Preocupante» (LVVP).



Na extensa família Turdidae, da qual fazem parte aves tão diferentes como os conhecidos Piscos-de-peito-ruivo e os omnipresentes Melros-pretos, nem sempre o processo de identificação se afigura como uma tarefa fácil, sobretudo quando nos deparamos com uma ave do Género Turdus. No continente português ocorrem regularmente seis espécies de melros e de tordos (nomes vulgares com que são chamadas as aves deste género), contudo, para o Parque Natural Litoral Norte apenas estão indicadas três: - o já referido Turdus merula (Melro-preto), residente muito comum, com alguns indivíduos invernantes; o Turdus philomelos (Tordo-músico), nidificante raro a pouco comum e invernante comum a muito comum; e a Turdus viscivorus (Tordeia), residente pouco comum, com alguns indivíduos invernantes. Entre as restantes três, duas surgem no LVVP na categoria de «Informação Insuficiente», mas no aqui citado livro AVES DE PORTUGAL são referenciadas como escassas, a saber, o Turdus torquatus (Melro-de-colar ou Melro-de-peito-branco), migrador de passagem e invernante raro; e o Turdus pilaris (Tordo-zornal), invernante pouco comum.

Até aqui, a minha lista pessoal coincidia com a das Aves referenciadas para o PNLN, mas nas minhas notas de campo, em particular durante Novembro e Dezembro, já tinha muitas menções a turdídeos, sem excluir a hipótese de se tratarem da ave que ainda me falta aqui referir, o Turdus iliacus (Tordo-ruivo), invernante pouco comum a comum, com o estatuto de conservação de «Pouco Preocupante». Esta espécie cinegética, indicada em vários livros e guias como bem distribuída no norte de Portugal, do litoral ao interior, presta-se a ser confundida com todos os outros tordos. De facto, durante o último mês de Dezembro eram observados na restinga do Cávado inúmeros Tordos-músicos,

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

mas também outros cuja observação levantava algumas dúvidas, até que no dia 22, nos relvados da margem direita, em Esposende, registei estas imagens



 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

que acabariam por confirmar em absoluto a presença do Turdus iliacus (Tordo-ruivo) na orla deste estuário. No dia 28, ainda foi fotografado outro indivíduo na restinga e tanto este como o primeiro alimentavam-se demoradamente de minhocas e caracóis.